Ano novo começa sempre com propostas de mudanças. Muitos querem eliminar de suas vidas condutas autodestrutivas e colocar no lugar posturas edificantes para o bem-estar e a autoestima. Trava-se então uma luta entre duas forças muito poderosas: de um lado a vontade verdadeira, e, do outro, um instinto quase involuntário age de forma contrária ao desejo. Nesse cabo de guerra, a segunda força costuma vencer e o sujeito se vê insatisfeito com a sensação de fracasso. Essa derrota explica por que tantas propostas feitas na virada do ano ficam só no imaginário.
No dia 03/01 observei que a academia que frequento estava mais cheia que o habitual. Penso que isso seja o reflexo do efeito “ano novo, vida nova”, mas agora, 15 dias depois, já não está tão cheia assim. Provavelmente até o fim do mês voltará à lotação normal.
E a pergunta que fica é: por que agimos assim, contra nós mesmos?
Além disso, há um equívoco na forma de pensar que dificulta ainda mais o alcance do objetivo proposto. O indivíduo que quer emagrecer precisa se privar do prazer de ficar deitado no sofá, em frente à televisão, e se comprometer a gastar esse tempo numa academia. Nesse momento ele passa a qualificar o exercício físico como vilão, afinal de contas ele está “roubando” seu lazer.
Começa aí um boicote mental, com inversão de valores onde a academia é demonizada, colocada como coisa ruim, e o sedentarismo, como bom. O mesmo ocorre quando alguém precisa parar de comer açúcar e o substitui por algo saudável. No mesmo instante a mente de quem está se privando hostiliza a comida substituta e romantiza o prazer que verdadeiramente estava roubando a sua saúde.
Pessoas com essa característica têm dificuldade de suportar sacrifícios em prol da recompensa futura. São impulsivos e querem o prazer imediato. Fazem hoje e resolvem amanhã. Preferem prejudicar a saúde, o sono e as economias financeiras para não se privarem de uma satisfação momentânea. São capazes de ficar numa festa até muito tarde mesmo sabendo que precisam acordar cedo no outro dia. Gastam dinheiro mesmo sabendo que precisam economizar. Planejam iniciar uma atividade física mas não querem largar a cama quentinha. Querem emagrecer, mas não param de comer guloseimas. A dificuldade em tolerar o sacrifício é tão grande que acabam fracassando no primeiro obstáculo. Se autoconcedem prazeres colocando de lado o objetivo principal. Vivem sob a justificativa de que “só se vive uma vez” (mesmo não acreditando nisso) e se apegam a esse lema para se permitirem excessos e diminuírem o sentimento de culpa.
Eis o vínculo com o viés infantilizado: crianças também são assim, vivem num mundo fantasioso onde querem satisfazer suas vontades imediatamente e sem contrapartida, independentemente das consequências ( a diferença é que as crianças não são capazes de mensurá-las).
Se na virada deste ano você fez uma lista de desejos a serem realizados, é preciso ajustar a mente para conseguir realizá-los, afinal o Réveillon cronológico só muda de fato a vida de alguém se ele for também psicológico.