Democracia relativa

Publicado em 16/03/2024 às 06:00.

Irlan Melo*

Democracia é a prática política de compartilhamento, de alguma maneira, do poder e das decisões políticas em meio aos cidadãos. O termo democracia tem origem grega, podendo ser etimologicamente dividido da seguinte maneira: demos (povo), kratos (poder).

Dentre as suas várias formas, destaca-se a: democracia representativa, que é mais comum entre os países republicanos do nosso mundo atual. Pela existência de vastos territórios e de inúmeros cidadãos, é impossível pensar em uma democracia direta, como havia na Grécia.

As democracias representativas são regidas por Constituições que estabelecem um Estado Democrático de Direito. Nessas organizações políticas, todo cidadão deveria ser considerado igual perante a lei, e todo ser humano deve ser considerado cidadão. Não pode haver desrespeito à Constituição, a Carta maior de direitos e deveres do país. A guarda da mesma dever ser realizada pelo STF.

O espírito de democracia e a defesa do sentido de justiça deveriam ser o norte dos três poderes. Infelizmente, na nossa pátria, o compromisso com as instituições parece estar acima do próprio texto constitucional. A observância ao devido processo legal, à ampla defesa e à presunção de inocência deveriam ser regra e não exceção.

Projetos autoritários de poder deveriam ceder ante a observância ao texto constitucional, o que não estamos vivenciando no país.

A forma como o Brasil se organiza política e administrativamente foi estabelecida pela atual Constituição da República em seu artigo 2º. Adotamos o princípio da tripartição do poder.

A leitura do artigo 2º deixa claro, os poderes são harmônicos, mas independentes entre si, tendo autonomia para atuar. Eles possuem atribuições distintas, mas sua autonomia permite que eles limitem uns aos outros, impedindo que exista abuso de poder e garantindo o funcionamento harmônico da nação.

Quando, entre os poderes, os mecanismos dos chamados “freios e contrapesos” não são suficientes para regular um dos três poderes, a democracia começa a se relativizar. Quando um dos poderes entra na esfera do outro, temos uma desproporção que não pode ser aceita em democracias sólidas.

A tripartição do poder foi criada com o objetivo de impedir a concentração de força e impossibilitar que o governo de uma só pessoa se transformasse em uma tirania. Porque, ao fim e ao cabo, quem diz, como o fez o presidente Lula ao se referir a Venezuela, que o conceito de democracia é relativo também deve relativizar o Estado de Direito.

Se seguirmos o caminho trilhado, com supremacia de um poder sobre os demais, viveremos sempre nessa tal “democracia relativa” e teremos que levar a sério o que desenhista e humorista Millôr Fernandes dizia como sátira: “democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim”.

* Advogado há 26 anos, pós graduado em Processo Civil, professor de Direito Constitucional das Faculdades Kennedy e Promove, vereador de BH

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