Resolvi estudar sobre a solidão para entender a convivência e acabei descobrindo diversas faces do tema, seja a solidão deliberada, a indesejada e a própria solitude.
Há pessoas que não se sentem bem sozinhas, mas preferem essa dor ao “sofrimento” do convívio, da vida em comunidade. Há os que se isolam, por conta própria, para reflexões, estudos, pensamentos, a que chamamos de solitude.
A solidão existe, mesmo em meio a muita gente, e pode acontecer quando um vazio imenso “nos preenche”. Esse estágio pode caminhar para uma depressão ou uma tristeza mais profunda, chamada de melancolia.
E há o abandono, em dois níveis, pelo que percebo: quando “um” abandona o “outro” e quando o próprio “outro” resolve abrir mão de si, se abandona.
Não sou especialista no assunto, sou apenas curioso. Tomo cuidado para não cair na armadilha do efeito “Dunning-Kruger”, que é um fenômeno que leva indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto a acreditarem saber mais que outros mais bem preparados.
Tenho visto filmes, lido livros, pesquisado na ciência e na filosofia para entender um pouco mais sobre este assunto que nos assola desconfortável, mas silenciosamente.
A psicologia chama de “percepção seletiva” a tendência de captarmos informações ligadas a uma necessidade atual que temos. Assim, quando estamos dispostos a comprar algo, parece que o que mais existe é anúncio daquilo à nossa volta – e olha que nem estou falando dos algoritmos.
Assim, minha antena perceptiva se conecta a tudo relacionado à solidão. Nesta atenção mais aguçada, vi uma notícia na Revista Pazes que contava sobre uma idosa, no México.
Sem saber o que estava acontecendo com o seu aparelho celular, foi até uma assistência técnica e pediu ao especialista que verificasse algum defeito, pois há mais de um ano que ela tenta falar com os filhos, por aquele dispositivo, mas eles não atendem e nem respondem.
O primeiro técnico, percebendo a fragilidade da mulher, cobrou alto preço por uma vistoria, o que a fez buscar outra loja.
Um jovem estava ao balcão e ouviu o lamento da idosa, que chorava falando que era o único aparelho que tinha e que não possuía muitos recursos para consertá-lo, pois a outra loja cobrou em torno de 1500 libras mexicanas ( 400 reais) e ela não poderia pagar e, assim, não teria seu aparelho consertado, impossibilitando o contato com os filhos.
O jovem técnico olhou o aparelho e não percebeu nada estranho ali. Mas a senhora continuava a sua história: “essa é a única maneira dos meus filhos falarem comigo e há um ano eles não me atendem. Esse aparelho só pode estar estragado, meus filhos não me abandonariam”.
Vendo que não havia defeito no celular e percebendo o desespero da mãe pela ausência dos filhos, o técnico garantiu que no dia seguinte entregaria o aparelho consertado e que ela não se preocupasse, o serviço seria uma cortesia.
Assim que a idosa saiu da loja, o jovem buscou o telefone de um dos filhos e ligou para ele, dizendo algo como: A dona Aurora é a sua mãe? Ela está precisando falar com vocês, faça contato, ela está desesperada e o celular dela está comigo, na loja, pois ela acredita que ele está com defeito. E arrematou: ela só precisa falar com vocês.
No dia seguinte a idosa foi buscar o aparelho conforme o combinado. De braços dados com ela estava o filho. Como o jovem técnico havia dito, o serviço seria cortesia, uma vez que nem debilitado o aparelho estava. A senhora sabia da gratuidade do serviço, mas levou um pouco de dinheiro para comprar algo, para recompensar o rapaz.
Ao postar esta história em minhas redes sociais, adverti que não sabia se era real. Um monte de gente mandou mensagem, dizendo que isso acontecia aqui, pertinho da gente mesmo, com muita frequência. Uma das pessoas me disse que era o que estava acontecendo com ela própria.
Sei que na família há relações conflitantes, sei que às vezes fazemos e falamos coisas que afastam as pessoas que amamos, sei que conviver é um aprendizado, mas também sei que “qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa”. Se o canto é um lugar ou uma pessoa, não sei, mas entendo que Belchior queria dizer que, independentemente do que seja, a vida das pessoas importa mais.