A vida é toda hora Eu estudei um pouco sobre filosofia e ciência, buscando respostas e tentando entender a felicidade. Foi quando amadureci que percebi que tenho
mais momentos felizes do que imaginava. Me traz muita felicidade ir para a casa da minha mãe, em Santa Luzia, e fazer bolos de fubá, cenoura e banana, além de cortar pão dormido para fazer torrada para o café.
E o pão de queijo que minha mãe faz, de uma marca cara ou do supermercado popular, acompanhado do café, me dá a sensação de estar vivendo meus melhores dias. A felicidade também está no meu banho, no décimo oitavo andar de um prédio de São Paulo, de onde adoro observar o pôr do sol que ilumina a Serra da Cantareira.
Sou feliz quando leio um livro ou assisto a um filme, quando posso caminhar às quartas-feiras à noite com a Maura ou nas manhãs de domingo, quando vamos pela Prudente até a Barragem Santa Lúcia. Adoro esperar um
livro novo chegar pelos correios ou ir a uma livraria ou sebo para garimpar alguns títulos e acabar levando mais do que eu pretendia, livros que nem sonhava que existiam.
Amo café. Amo fazer café, seja na máquina, coador, chaleira ou ebulidor. Adoro o cheiro que sobe do filtro. Tenho um prazer tão grande em tomar a água fresquinha do filtro de barro.
Eu adoro ir a Recife e acordar cedo, ou ser acordado antes das 6h pelo sol. Levantar, caminhar na praia e parar na padaria Boa Viagem para comer uma tapioca e comprar curau e tareco. Sentar numa cadeira na areia, com guarda-sol, sem entrar no mar, pedir um ou dois cocos para justificar o empréstimo da cadeira. E, no fim da tarde, andar pela orla, indo até o Parque Dona Lindu, parando na volta para comprar uma tapioca rendada recheada de carne seca. Eu adoro cuscuz, mandioca cozida com ovo frito, pinha, banana-da-terra cozida ou frita.
Amo ir com o Ílvio e o Maurício para a praia, sentar no bar do Chico, lá no Espírito Santo, sem preocupação com a hora. Caminhar com o Ílvio na praia, rir do Carlinhos Nunes, do Wolney e dos apertos do Nonô. Escrever o
que desejo para o ano seguinte na casa do Zé me dá uma felicidade tremenda.
Eu adoro conversar por mensagem escrita com o Hippert, porque ele sabe que odeio mensagem de áudio e ligação. Adoro ir a padarias. Gosto de fazer caminhada em Santa Luzia com meu irmão e, na volta, parar no açougue
e comprar fígado de boi para ele fazer para mim, bem acebolado. Adoro o carinho da minha irmã, traduzido no prato que peço e ela faz com gosto. Ah...comer a comida feita pelo Adriano Bernardino, que quer tanto agradar e acaba fazendo um banquete nordestino.
Amo. Repito: amo os projetos do Tio Flávio Cultural. Ir com o Tiago Carmona a uma ação social e vê-lo observar tudo; as companhias do Lucas Veríssimo e do David, bem como da Fernanda e da Myriam, em situações difíceis, me ajudaram a conseguir levar adiante o trabalho. Ir ao presídio e escutar a cobrança dos presos pelos prêmios do campeonato de futebol: paçoquinhas.
Adoro chegar ao condomínio onde moro e conversar com o pessoal da recepção, só sobre assuntos sem importância nenhuma. Gosto mais ainda quando desço do elevador e o Rodrigo fica zombando de terem chegado
caixas de doação de livros. O Marcelo Ricco foi buscar umas doações para mim e chegou com 40 caixas, que o Rodrigo arrumou no meu quarto, deixando um corredor para a cozinha e outro para o quarto.
Adoro quando a Maura faz caldo de feijão e canjiquinha. Quando a mãe do Nonô faz canjica doce ou a Lígia vem passar uns dias na minha casa e faz salada com tomates cereja e até muçarela de búfala. Amo ir a São Paulo e
conhecer padarias e cafeterias novas. Adoro parar na padaria da entrada de São Joaquim de Bicas e comer biscoito frito e chipa de queijo, esperando a Angelita chegar. Ou parar na Mercearia da Luana e comer um pão francês com muçarela e presunto, sem miolo e sem manteiga, que a atendente já sabe como faz.
Adoro ligar para minha mãe e ela atender. Adoro quando a Bárbara chama para ir à casa dela tomar café e a
Márcia me apanha onde quer que eu esteja e vamos conversando, colocando o papo em dia. Gosto do mel das abelhas da casa do Sérgio. Amo os relatos dos voluntários após cada visita realizada e a organização das visitas nos grupos do zap.
Adoro reencontrar ex-alunos, falar do passado com professores que trabalharam comigo, ir ao café Nice com a Teca, almoçar com a Ana Roberta no centro da cidade, lembrar com a Nayara o tanto que a gente já chorou junto, reencontrar a Dóris e conversar com o Kadinho.
Adoro as indicações de filmes da Ana, professora de Biologia, e da Silvana Chiaretto. Adoro conversar com tanta gente: Enéas (as viagens de carro para as APACs são memoráveis), Tatiana da FBAC, Varda, Mari Flecha,
Silvinha, Odette Castro. Conversar com a Márcia Lapèrriere, ouvir as histórias da Luciene Albuquerque. Adoro rir com Haidê e Sãozinha. Tenho uma sensação boa, passados anos, ao lembrar da fase mais difícil da minha vida, em que dividia o apartamento com o Vagner e fomos ao supermercado, com o último crédito no cartão, para comprar pescoço de peru, que comeríamos todos
os dias, pois estávamos sem dinheiro nenhum e eu não queria que minha mãe soubesse. Uma fase superada.
Como adoro ouvir as histórias da minha prima Simone, especialmente aquela em que a polícia, numa blitz, fez sinal para ela parar o carro e, sem conseguir abrir a janela do automóvel, ela sinalizou com a mão que o carro
estava cheio. Como gosto dos meus amigos de Santa Luzia, que representam uma das belas lembranças da minha infância. Adoro ir à casa de Kenny e Roberta, conversar com Ana Paula, que eu tanto estimo. Sempre me senti mais forte ao lado dela. Foi minha primeira sócia em eventos culturais em Santa Luzia. Juntos, organizamos festas, peças de teatro e até um informativo cultural da cidade. Já participei de um grupo de teatro com Tia Ângela, prima da minha mãe, apresentando peças infantis em creches.
Amo pegar carona com a Regina no fim de ano, especialmente no dia 24 de dezembro, quando realizamos um jantar em um abrigo para pessoas em
situação de rua. Gosto da imensa mesa de café da casa de Clara. Valorizo momentos raros, como encontrar Lau, que foi quem ajudou minha mãe a nos criar.
Adoro gravar o Multiprosa com a Jhade e o Contracapa com o Michael e o Cylan. Sentia uma alegria especial ao visitar a rádio 98, ser recebido pela Fernanda, conversar com o chefe Eduardo Maia, com a veterinária Flavinha e
com a psiquiatra Ana. Sempre ria muito com Fernanda, Matheus e Antonélio.
Também lembro com carinho das conversas quase diárias com o Sander, enquanto escrevíamos um livro, e da pequena Sofia perguntando por mim.
Ah, que saudade da Márcia e da Ana Carolina, da FDC, a quem fui apresentado pela Maria Flávia. Foram elas que me apresentaram à Ana Pantuza. Adoro quando a Ray e a Flávia me mandam mensagens avisando que fecharam uma palestra com um cliente e, em seguida, começam a me mimar, cuidando da reserva de hotéis e da logística. E claro, sempre me deixam na última poltrona do ônibus, né?
Detesto sentir dor, mas, quando isso acontece, é a Maura e o Nonô que me levam ao hospital. O Rafa Coelho insiste em trazer sopa, assim como a Marilu, o Enéas e o Ílvio. Fico imensamente grato quando a Paty Filizzola e a
Rachel Del Menezzi deixam sacolas de doações para os bazares de instituições sociais, ou quando o Bruno Fernandes e a Renata Gazinelli entregam amenidades de hotel para serem distribuídas em lares de idosos e
repúblicas para pessoas em situação de rua. Me alegra receber uma mensagem do Paulinho no meu aniversário e um presente da Greco Design, sempre pontual a cada ano.
Há coisas que realizei e outras que ficaram pendentes: fiz palestras em universidades para as empresas juniores, assim como participei de conversas inesquecíveis com o Celso Vasconcellos e com a Liana Gottlieb, em São
Paulo. Mas fiquei devendo a ida a São Tiago com o Fausto para conhecer a festa do café com biscoito. Também há coisas boas que tive e que não terei
mais: o sorriso da minha tia Nise, as conversas com o Daniel sobre sua vida, e a maneira como o Alex me apresentava às enfermeiras da UTI: "Vocês nunca
ouviram falar do Tio Flávio?" E elas, tentando entender que celebridade era essa, conhecida somente por ele.
Os bolinhos de chuva da Zezé, o doce de ambrosia da minha avó no meu aniversário, os muchochos do meu avô, o sorriso e o abraço do meu pai, e o meu aluno e estagiário Mateus, que sonhava em ser professor.
Recentemente, assisti a um vídeo da Fernanda Torres em que ela dizia que muitas vezes esperamos a felicidade em pequenos fragmentos de nossa vida, aqueles que consideramos os grandes momentos — uma viagem, um casamento, um show. Mas, na verdade, a felicidade está nos fatos cotidianos, nos momentos simples carregados de vida. “A vida é toda hora”, diz a atriz.