O filme “A última nota”, lançado em 2020, é rico em sua fotografia, com paisagens lindas, além de suas reflexões, que vale dar pausa para pensar sobre diálogos ou pensamentos estabelecidos.
Ele retrata a vida de um célebre pianista, que tendo sofrido um grande trauma pessoal, com a morte da esposa, teve um bloqueio profissional e desenvolveu um medo de voltar aos palcos, o que o remeteu a uma profunda tristeza e solidão.
Já no livro “A morte de Ivan Ilitch”, Leon Tolstói é cirúrgico ao descrever a dor de um homem, servidor público abnegado, pai e esposo, que acometido por uma doença faz um processo de remorar sua existência e resgata como ele tratou relações e oportunidades de sua vida.
Em dado momento, Tolstói traz uma afirmativa forte, dizendo que “era verdade, como disse o médico, que a dor de Ivan Ilitch era terrível, mas pior do que ela eram seus sofrimentos mentais, sua pior tortura”.
O humanista francês do século XVI Michel de Montaigne disse, certa feita, que “os mais severos e frequentes males são aqueles que a imaginação nos faz alimentar”, o que Sêneca, no primeiro século depois de Cristo, já defendia, afirmando que sofremos mais pela imaginação do que de fato, na realidade.
Somos o país mais ansioso do mundo, de acordo com o médico neurocientista dr. Pablo Vinícius, pois o estilo de vida que adotamos, além dos princípios e valores da sociedade, estabelece as ditaduras da beleza, da felicidade e do homogêneo, em que o certo é sorrir mesmo estando triste e ser igual àqueles que são vendidos como ideais, mesmo distantes do nosso “eu real”.
Tudo isso nos adoece, esgota nossas energias e nos lança ao cansaço, à fadiga crônica, criando uma atmosfera de impotência e culpa contínua.
José Eduardo Agualusa, escritor e jornalista angolano, disse que “todos podemos, ao longo de uma vida, conhecer várias existências. Eventualmente, desistências”. Talvez devamos colocar aí, também, que desenvolvemos diversas resistências, que nos prendem, como se tivéssemos âncoras, que nos ligam a coisas, valores, pessoas e experiências passadas ou que nos levam a sonhar sonhos dos outros e não os nossos próprios.
Para que a gente consiga evoluir, é preciso desvincular de algo que hoje já não faz parte da nossa vida, mas que insistimos em gastar nossa energia mantendo-as, seja por medo do rompimento ou por carência, mesmo sendo algo que nos faça mal.
Um verbo muito usado hoje é o “despertar”, já que parece que nas relações familiares, de trabalho, sociais de um modo geral, estamos em estado de torpor, caminhado sem rumo, numa estrada que não nos conduz a lugares desejados, mas que a gente não consegue ao menos se dar conta disso.
Sentido da vida não é uma chave mágica, como o gênio da lâmpada, que ao encontrar vai resolver todos os nossos dilemas. A vida favorece a quem amadurece, fruto de seus questionamentos, dores, momentos de alegria divididos, choros e sorrisos. Mas, para isso, definitivamente, temos que estar despertos.
Talvez perdoar seja um bom começo. Nos perdoar ou aos outros não é eximir ninguém das consequências de algum ato, mas, como diz Dom Miguel Ruiz, resgatando a tradição Tolteca, “o perdão libera cada um de nós da necessidade de odiar” e, acrescenta: “tira o passado dos nossos ombros, a fim de avançarmos sem seu fardo”.