Quando fui convidado para participar de um evento cultural que celebra o envelhecimento, e que teria, em todos os palcos e mesas-redondas, profissionais e artistas 50+, comecei a pensar sobre já ser reconhecido como um “pré-idoso”, como diz meu amigo e jornalista Luiz Hippert, já que, na legislação brasileira, considera-se uma pessoa idosa a partir dos 60 anos. Nós poderíamos questionar que o termo "pré-idoso" abarca inclusive aqueles a quem chamamos de pré-adolescentes, mas você está me entendendo. Fiquei pensando que, além de alguma história dentro desse movimento da longevidade, fui lembrado porque, de fato, já faço parte da robusta gaveta brasileira dos 50+.
Mas é curioso como as coisas se transformam. Em um país que começa a chamar alguém de idoso aos 60, ser “pré” qualquer coisa parece uma espécie de limbo. É como se disséssemos: “calma, ainda não cheguei lá, mas já estou me aproximando”. Enquanto isso, o corpo começa a dar sinais: uns fios de cabelo teimam em mudar de cor, ou abandonar a cabeça — como é o meu caso; algumas lembranças insistem em ganhar mais espaço na conversa do que os planos para o futuro; a seletividade começa a ficar mordaz; alguns valores são revistos; e a necessidade de se reinventar aparece para muita gente. Ou, talvez, em alguns casos, quase nada disso aconteça, uma vez que o que as pessoas idosas também querem é fugir dos estereótipos.
Ainda assim, a sensação é de estar num ensaio constante para um espetáculo que só começa mesmo quando a cortina abre aos 60. Mas, pode ser um espetáculo? De acordo com as reflexões da professora e filósofa Maria de Lourdes Gouveia, ela é uma velha e uma moça que convivem dentro de si própria. Uma das partes da fala da professora Maria de Lourdes foi que hoje as pessoas idosas são mais amparadas que no passado, que elas eram invisibilizadas. Não que não aconteça ainda hoje, mas esta pensadora de 88 anos, nascida em Pernambuco e apaixonada por Minas, quer nos fazer pensar.
Além das atrações artísticas no fim de semana, o Festival Sabiá promoveu também os Encontros Sabiá, que foram uma imersão em debates, vivências e experiências voltadas para temas relacionados à arte, cultura e envelhecimento, reforçando a missão do festival de estimular reflexões sobre etarismo, longevidade e expressão artística na maturidade.
O projeto, que se iniciou em 2019, rompe com o falso dilema entre modernidade e envelhecimento, demonstrando que a inovação e a experiência não apenas podem coexistir, mas formar uma síntese poderosa nas expressões artísticas. "Nossa missão é protagonizar pessoas 50+ e, para este ano, queremos possibilitar sua presença nos debates sobre o futuro, sobre a modernidade que, a cada vez mais, transforma a nossa realidade social. Como ser 50+ nesse contexto?", afirma Samir Caetano, um dos idealizadores do projeto.
Entre os destaques da programação estão shows musicais e atrações teatrais como Amelinha, Tizumba África 50, Maria Cutia, Grupo Atrás do Pano, além das Meninas de Sinhá, que representam a força da tradição, da cultura popular em diálogo constante com a contemporaneidade.
Para se ter uma ideia da riqueza deste movimento, os Encontros trouxeram potências da filosofia, artes, ciência, comunicação e outras áreas para discutirem temas de extrema relevância. A primeira roda de conversa, “Vivências e Inspirações com 50+”, explorou dicas práticas e inspiradoras sobre longevidade ativa, saúde, arte e propósito. Com os convidados: Elias Santos, professor, jornalista e apresentador de rádio e TV; Fábio Furtado, coordenador do Grupo Galpão Cine Horto; Zu Moreira, jornalista; Meibe Rodrigues, atriz; e Renata Martins, diretora de Políticas para Pessoa Idosa da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos de Belo Horizonte.
Teve ainda contação de histórias com “Akenda Mbani, o homem que não ia duas vezes ao mesmo lugar”, da autora e editora Rosana Mont’Alverne. O violonista mineiro Juarez Moreira encerrou o dia, trazendo sua trajetória de mais de 50 anos de carreira.
Na quarta-feira, houve a exibição do curta-metragem “O Vô Tá On”, dirigido por Clério Dornell, que aconteceu logo após a roda de conversa sobre “Etarismo”, que explorou as diversas formas de preconceitos relacionados à idade. Eu fui convidado desse momento, ao lado da dançarina e coordenadora de programas e oficinas 60+, Ana Amélia Cabral; Natália Dornellas, criadora de conteúdo no @somos.avosidade; e Renata Giffoni Mafra, psicóloga e coordenadora do Programa Arnaldo 50+ da UniArnaldo, além da professora Maria de Lourdes.
Com direção de Lucas Assunção, na quinta-feira foi exibido o curta “Memórias Culinárias do Quilombo Ausente Feliz”, que mergulha nas tradições de uma comunidade quilombola. A roda de conversa com o tema “Fazer arte com 50+” trouxe reflexões sobre a presença e contribuição de artistas maduros no cenário cultural. Com as convidadas: Ligia Amadio, maestrina da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais; Titane, cantora; Tina Dias, atriz do Grupo Armatrux; e Lena Cunha, professora e pesquisadora da área cultural. Tina Dias seguiu na programação com a performance “Mulher Cueca” e Titane, com uma apresentação musical imperdível.
O Festival Sabiá 2025, apresentado pelo Ministério da Cultura, Governo de Minas Gerais, Cemig e Instituto Unimed BH, é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte, Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais e Lei Federal de Incentivo à Cultura, com o patrocínio da Cemig, Instituto Unimed BH — através do incentivo de 5,3 mil cooperados e colaboradores — e Banco Mercantil do Brasil. Realização: EncantaQueVoa, Governo de Minas Gerais – Governo Diferente, Estado Eficiente, e Governo Federal – União e Reconstrução.
Mais informações: www.portalsabia.com.br @portalsabia