Sabe aquela mensagem instantânea que nos chega dizendo: “preciso muito falar com você”? Às vezes não conhecemos nem quem a enviou, mas o incômodo e a dúvida pairam no ar, já formulamos em nossas mentes uma série de hipóteses, possibilidades e dúvidas.
O mesmo se dá quando mandamos uma mensagem para alguém e ela é lida, mas não respondida. Os nossos “fantasminhas” começam a trabalhar internamente, fazendo-nos recordar o que poderíamos ter feito à pessoa que ela não tivesse gostado para nos ignorar desta forma, por algumas horas ou dias. Até mesmo nem responder.
A esses fantasmas damos o nome de “viés da negatividade”, que constituem justamente a tendência que temos de pensar o pior das situações, sem ao menos conhecê-las, em muitos dos casos. Um esquecimento por parte do outro ou distração já viram, em nossa mente, um campo de batalha.
Para “combater” tais pensamentos, não é recomendável criar uma bolha em que a gente entre e viva sem a dor, pois um dia vamos ter que sair dali e encontrá-la; também não é o caminho mais adequado viver no outro extremo: de tanta dor e negatividade.
Alguns cientistas falam que é muito importante criar mecanismos para, mesmo em meio aos problemas e “tempestades” da vida, a gente identificar no cotidiano aprendizagens, crescimento e positividade. Uns dizem que é muito válida uma análise diária, inclusive nos piores dias, do que se configura de positivo e ir anotando, no fim do dia, para que o cérebro se acostume a ter olhares diferentes em situações adversas.
Algumas pessoas que fazem isso com êxito criaram até inovações, colocando potinhos em que depositam suas boas lembranças e recorrem ali quando necessário ou, até mesmo, escrevendo um livro da sua vida, com as recordações.
Os tais “TBTs” das redes sociais também podem ser uma maneira da pessoa recordar momentos bons para, após isso, ter um pouco mais de fôlego para lidar com o que vem pela frente, positivo ou não. O verbo “recordar” tem um significado lindo e devia ser algo sacralizado em nossa vida. Ele quer dizer “fazer passar, novamente, pelo coração”. E quando falo em sagrado, a definição desse termo pode ser entendida como “dar sentido” a algo.
Tudo isso não quer dizer que devemos viver no passado ou fugir do presente, mas é um convite a encontrar em todas as situações, algumas possibilidades de fortalecimento de pessoas, relações, ideias, valores, cultura.
Essa semana estive numa unidade socioeducativa, que recebe adolescentes em conflito com a lei. Geralmente as palestras são para turmas de 20, dessa vez foram seis participantes a cada 40 minutos. Os meninos chegam mais observadores e quando conseguem confiar em quem fala, vão baixando as proteções e até expondo os seus problemas.
Não falamos da infração e nem os vitimizamos, mas buscamos entender o papel de cada um a partir do momento atual, apesar da carga passada. Dentro dessa unidades vejo o trabalho de muitas pessoas, entre direção, agentes e técnicos da Suase, comprometidos em ajudar cada adolescente a encontrar seu rumo. Tentando, com seu conhecimento, olhar cada um como um indivíduo e não uma “massa carcerária”.
E outros exemplos de positividade nas adversidades não faltam: logo ao amanhecer recebo uma mensagem da Fátima Sanson, do projeto Ajude a Ajudar, que faz um lindo trabalho no Norte de Minas, com várias fotos das famílias recebendo cestas básicas e brinquedos. O cenário é árido, muitas casas com “chão batido” mas, apesar das máscaras, as crianças estavam com uma alegria nos olhos. Sabemos que não é a solução dos problemas, mas é um lenitivo extremamente importante: saber que não está sozinho.
Nesse mesmo dia o André Lara Resende, da ONG Um Pé de Biblioteca, me comunica o lançamento da campanha “Financiando Sonhos”, em comemoração aos 17 anos do Instituto. Empresas e pessoas físicas podem ajudar a fazer com que livros cheguem a bibliotecas parceiras (https://evoe.cc/livroupdb), ou adquirir o livro da ONG para dar de presente e, assim, fomentar o prazer da leitura.
São tantas e recorrentes notícias, momentos, ações, experiências positivas que nos convidam a não descartar o “viés da negatividade”, pois ele é necessário em alguma medida, mas a incorporar um novo olhar ao cotidiano.