Não sei como cheguei até aquela série na plataforma digital, mas ela tinha acabado de ser lançada e, sem planejar, fui atraído pelo enredo de um jogo. Nunca havia assistido filme ou série coreana, ao menos que eu me lembre. Ao postar isso numa rede social, muitos conhecidos começaram a indicar outros títulos e a falar da diferença entre eles e outras produções de badalados estúdios norte-americanos.
O primeiro episódio é bem instigante, mas parece que a coisa vai perder sentido por ali mesmo, porém é aí que o jogo se desenrola e a trama vai ficando interessante. Eu passei a assistir com um olhar de crítica social, além de ter tido a curiosidade de pesquisar o uso das brincadeiras infantis, tradicionais na Coreia, sendo que algumas são culturalmente conhecidas por aqui, mas, logicamente, não com o contorno usado na série.
O endividamento, a ganância, as animosidades, a traição são escancaradas, além da ingenuidade de alguns, a compaixão, a amizade. Um personagem que me chamou muito a atenção foi o de um idoso, com altas dívidas financeiras como todos ali, e que também convivia com a demência.
Desde o início da série a música do Frejat vinha à minha mente:
Amor pra recomeçar:
“Eu desejo que você ganhe dinheiro
Pois é preciso viver também
E que você diga a ele, pelo menos uma vez
Quem é mesmo o dono de quem.”
A série Round 6 é isso, um mix de sentimentos contraditórios, violência, angústia, ansiedade, desesperança e, creiam, até mesmo, no fim da primeira temporada, um arzinho de esperança provocado pela cena de um morador de rua, vista por uma janela.
A classificação indicativa é de 16 anos, devido às diversas cenas e gatilhos de violência e autoextermínio.
No mesmo momento em que vão crescendo os comentários elogiosos sobre a série, de outro lado aparecem pontos de vista divergentes, falando sobre a exposição de crianças e adolescentes a essa barbárie. Muitos argumentos são muito bem construídos, já que quem os defende diz que Round 6 mescla as brincadeiras tradicionais coreanas com a violência gratuita, pessoas se digladiando para sobreviverem e ganharem um prêmio, cada vida sendo convertida em dinheiro e, até mesmo, a exposição do suicídio.
Alguns especialistas médicos, professores, pais falaram muito sobre o desserviço da produção cinematográfica e que muitos adolescentes, atraídos pelos comentários que inundaram as redes, assistiam as cenas de maneira aflitiva, porém curiosa.
Só que, do outro lado, defensores da série começaram a expor, também, que a ideia de blindar os filhos não seria uma saída mais adequada. O legal seria os pais assistirem com os filhos, ou deixá-los à vontade para escolher se querem ou não ver, e depois discutirem questões tão ricas do contexto humano, social, relacional, profissional e por aí vai.
Sei que há pessoas, adolescentes ou não, que têm ainda uma fragilidade em relação a algumas abordagens, mas talvez seja interessante trazer para a discussão a proteção dos pais com os seus filhos, o que é natural, mas o excesso de proteção, também, a que muitas famílias lidam com suas “crias”. Tem um filme italiano recém-lançado, na mesma plataforma digital, chamado “Meu irmão, minha irmã”, em que a mãe tem um excesso de proteção – doentio até, como todo excesso – em relação ao filho que convive com uma síndrome. Em alguns casos, com feridas muito abertas de algum sofrimento, é melhor que não se assista mesmo a série Round 6.
Entendendo os dois lados, sei que a produção coreana talvez não tenha imaginado que uma profícua discussão poderia vir dessa ambiguidade que ela provocou.
De repente, as redes e mídias sociais se encheram com comentários sobre a série. Muitos falando dos pontos de reflexão que ela promove, fazendo-nos entender nossa condição humana.