Em seu texto de apresentação da exposição Vrido, do pintor Dudi Maia Rosa, em cartaz até dia 11, na Galeria Millan, o crítico Rodrigo Naves chama a atenção para a "dimensão trágica" das 70 pinturas exibidas na mostra, todas em resina poliéster pigmentada. Segundo Naves, ela vai além da metafísica da luz dos pintores religiosos em atividade entre os séculos 14 e 15 - os mistérios cristãos, nesses casos, eram quase sempre interpretados por representações metafóricas da luz. Para o crítico, Dudi quer "experimentar um mundo que reluta em mostrar-se em sua dimensão material, já que há muito ele vem convertendo-se em imagem".
De fato, um pouco à maneira de Rothko (1903-1970), a paleta cromática de Dudi serve à luz interna que emana da resina translúcida, mas não permite ver com nitidez um mundo pesado em sua opacidade. Intangível, a luz obrigou grandes artistas do passado, como Vermeer, a resolver o dilema do ilusionismo ao amalgamar espaço real e pictórico. Se Vermeer trocou o amplo repertório da pintura religiosa pelo limitado acervo de imagens tiradas do mundo concreto, também foi por querer "experimentar" esse mesmo mundo que Dudi agora revisita.
Vale lembrar que Dudi começou suas experiências com resina sintética nos anos 1980, quando explorou em grafismos referências bíblicas, como uma espécie de Cy Twombly (1928-2011) a evocar uma dimensão mítica com figuras evanescentes. A desmaterialização da forma ao lado de uma luz que prefigura um novo movimento na pintura - menos reverente à tradição - justifica a suspeita de que Dudi, ao optar pelo aspecto ambíguo dessas obras - entre vitrais e telas de projeção - cede à sedução pop das cores sem abandonar o credo cristão no poder regenerador da luz. Ela é a contraparte desse mundo opaco, o elemento visual mais transiente que se confunde com a cor no repertório das representações alegóricas pré-renascentistas. Por vezes é preciso revisitar o passado para avançar. É isso o que faz Dudi Maia Rosa.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.