O vereador Henrique Braga (PSDB) abre, na próxima quarta-feira, os trabalhos de 2017 da Câmara Municipal sentado oficialmente na cadeira de presidente do legislativo municipal. Em dezembro, ele, que era vice, assumiu a Presidência para um mandato tampão por conta do afastamento pela Justiça do então presidente Wellington Magalhães (PTN), suspeito de desvio de recursos da Casa. Passou, então, a costurar sua candidatura e derrotou o candidato apoiado pelo prefeito Alexandre Kalil, Doutor Nilton (Pros).
Nesta entrevista ao Hoje em Dia, Braga, que é pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular, fala do desafio de aprovar o novo Plano Diretor de Belo Horizonte, de sua relação com o prefeito Alexandre Kalil e trata de assuntos polêmicos, como o projeto que institui o ensino religioso nas escolas municipais e a reforma do prédio da Câmara que custou R$ 1 milhão.
Qual o projeto de lei prioritário no momento?
O projeto mais debatido, que é a esperança de Belo Horizonte, é o Plano Diretor. Vamos ter que enfrentá-lo e dar uma resposta à altura da cidade. O Executivo da gestão passada segurou o projeto, o colocou de volta para votação, depois tirou, foi fazendo emendas e mais emendas... virou uma colcha de retalhos tão grande que nem a prefeitura estava entendendo mais.
O que será feito?
Na conversa que tive com o novo prefeito, Alexandre Kalil (PHS), falamos sobre o projeto. Ele teve uma ideia, que talvez prospere, de desmembrar o ‘social’ do ‘empresarial’ no Plano Diretor. Se ele conseguir fazer isso, certamente aprovaremos de cara o “social”. E o “empresarial” seria discutido depois.
Aqui não existe o grupo do Henrique Braga ou o do Welington Magalhães. Eu não tenho grupo. Hoje lidero, na Câmara, 40 vereadores
Qual a diferença?
O "social" envolveria, por exemplo, a questão das ocupações urbanas, o pessoal que precisa regularizar a situação do imóvel, projetos do Minha Casa Minha Vida.
Mas é possível separar "social" e "empresarial"? As duas coisas não são dependentes, já que o fundo de habitação social seria financiado, em parte, pela autorização (outorga onerosa) paga em construções acima do limite máximo de área permitida?
Foi essa questão da construção que barrou o avanço do Plano Diretor. O novo Plano Diretor determina que (o direito de área construída) vai ser tudo uma vez a área do terreno, na cidade inteira. Se isso for aprovado, teremos que pagar para construir mais do que a área do terreno e pelo preço que o município determinar. Disseram que a mudança seria para financiar um fundo (habitacional), mas no Brasil, por várias vezes, criou-se fundos que não tiveram resultado nenhum.
"A escolha de Gilson foi diferente, mas uma ótima escolha"
Os vereadores estão de acordo com o projeto?
Tudo que se fizer hoje de social haverá o aplauso da sociedade em geral, mas quando mexemos naquilo que é do patrimônio da população, há resistência. O empresário que quiser construir o prédio pagará a outorga onerosa (a autorização para construir acima do limite 1.0), mas quem vai pagar por isso, no final das contas, é o consumidor, o cidadão que vai comprar o apartamento. Essa situação cria resistência ao projeto na Câmara. Acredito que, pela habilidade que a equipe do prefeito tem para estudar a questão, ela será resolvida. É um projeto do Executivo. De acordo com o nosso regimento interno, a prefeitura terá que dar uma luz em 30 dias, a partir do dia 1º de fevereiro, já que o projeto virou o ano em tramitação. O prefeito pode até suspender temporariamente a tramitação, para ele poder fazer o que deseja.
Na conversa que tive com o novo prefeito, Alexandre Kalil (PHS), falamos sobre o projeto. Ele teve uma ideia, que talvez prospere, de desmembrar o ‘social’ do ‘empresarial’ no Plano Diretor
A tendência é votar o Plano Diretor fatiado?
O prefeito falou que ia fazer um estudo. Se ele conseguir, aprova o social mais rapidamente. Priorizar a questão das ocupações urbanas, principalmente. No segundo momento entraria a questão da outorga onerosa. É uma questão que não dá para escapar, várias das grandes capitais hoje têm outorga. A questão é buscar um meio termo, não reduzir toda a cidade para 1.0. Que seja 1.0 em algumas partes da cidade, mas em outras 1.5 e 2.0, por exemplo.
Um argumento é que houve amplo processo de participação popular, já que o Plano foi construindo a partir da última Conferência de Política Urbana da cidade.
Segundo as pessoas que participaram ativamente das conferências, o substitutivo que foi feito por último no projeto deixa muito a desejar ao que foi discutido na Conferência. E conferência por conferência, levar funcionário com carteirinha da prefeitura para debater, como aconteceu? Não concordo com isso. Era assim: chegava a turma de funcionários da prefeitura, enchia o auditório, e o cara que ia à conferência depois de trabalhar, encontrava o auditório lotado, ficava de pé e ia embora para casa. A questão acabou sendo discutido só pela assessoria da prefeitura.
Como fica a reforma administrativa? O prefeito adiantou alguma coisa?
Até o dia 1º ele disse que apresentaria alguns projetos, sendo a reforma administrativa a prioridade. Na Câmara Municipal, na primeira semana de trabalho, que começa dia 1º de fevereiro, teremos a definição das comissões temáticas. Depois, certamente, começaremos a trabalhar em todos os projetos. Temos quase 80 projetos esperando definição só na Comissão de Legislação e Justiça.
Você consegue ver uma mudança no perfil da Câmara desta para a última legislatura?
Esse perfil só é possível de saber com o tempo. Mas haverá mais debate, principalmente no início da legislatura, já que temos 23 novatos. Quando o vereador novato chega, de acordo com a sua ideologia e segmento que representa, vem querendo mostrar quem ele é e o porquê de estar aqui. No princípio, vamos ter esse debate mais acirrado. De todo modo, acredito que nesses dois primeiros anos a produção da Câmara será superior à que foi na legislatura passada.
Como o senhor vê a escolha do vereador Gilson Reis (PCdoB), conhecido por seu posicionamento forte enquanto oposicionista, para ser líder do governo Kalil?
A escolha de Gilson foi de uma visão diferente, mas uma ótima escolha. Ele é um vereador bom de diálogo e tem algo que muitos políticos não têm, que é palavra. Nesses quatro anos em que trabalhamos juntos, no que ele tratou comigo, mostrou ser um cara de palavra. É um cara de personalidade e palavra fortes. Uma história ajuda a entender a situação. Quem já está na Câmara há mais tempo sabe que quando o ex-prefeito Marcio Lacerda (PSB) tinha Wagner Messias (DEM), o Preto, enquanto opositor, o vereador era terrível. Quando o Lacerda foi reeleito, o convidou para ser líder. E foi um dos melhores líderes que vimos trabalhar. Além disso, há duas maneiras de ser líder: chamando tudo para você ou repartindo a tarefa com as vice-lideranças. Se o Gilson fizer desse jeito, repartindo, com certeza, será uma ótima liderança.
E o Kalil? Como é a sua relação com o prefeito? Vocês tem se encontrado?
Depois da nossa posse, nos encontramos duas vezes. Numa delas, pedi para ele me ajudar a trazer o restaurante popular de volta para a Câmara. E da outra, conversava com um secretário e ele chegou. Meu relacionamento com ele é muito bom.
Será uma relação diferente da que existia com o ex-prefeito Marcio Lacerda?
Ele tem uma vantagem: conversa olhando nos seus olhos. A maneira de Kalil agir é assim: quando eu falei com ele do restaurante popular, ele disse “tá fechado, vamos colocar para funcionar”. Logo em seguida, uma outra pessoa da mesa em que estávamos pediu para ser ajudada em outra questão e ele disse: “isso aí eu não resolvo, não tem jeito”. Percebi que com ele não tem jeitinho brasileiro. É diálogo e posição firme. Kalil deixou claro: “Henrique, você não precisa avisar. A casa é sua. Sempre que precisar, pode chegar”. Por essa abertura, vejo que ele não terá dificuldade de governar BH junto à Câmara Municipal.
"Eu votei contra. Hoje, não vejo necessidade de ter aula religiosa em escola"
Como está a relação do senhor com o vereador afastado e ex-presidente da Casa, Wellington Magalhães (PTN)? Circula a informação de que ele trabalha para manter influência na Casa, o que levou a um racha entre o grupo do senhor e o dele.
Aqui não existe o grupo do Henrique Braga ou o do Welington Magalhães. Terminada a eleição, no dia 2 de outubro, formamos um grupo, que chegou a ter 27 eleitos e do qual Wellington participava, com o objetivo de manter a unidade na eleição da mesa diretora, em janeiro, e tentando fazer a Câmara mais transparente. Como Wellington era presidente, ele chamava as reuniões. No dia em que ele foi suspenso (em dezembro, na operação Santo de Casa), assumi a Presidência e continuei me reunindo com o pessoal, com o objetivo de manter a unidade. Culminou na minha eleição. Eu não tenho grupo. Hoje lidero, na Câmara, 40 vereadores, independentemente da cor partidária. Tanto que tenho chamado um por um para conversar, respeitando a ideologia de cada um. É claro que, como a casa é de debates, haverá confronto e até bate boca, mas estarei aqui para presidir e apaziguar, quando necessário.
Caso o Ministério Público e a Justiça concluam pela culpabilidade de Wellington, haverá processo contra ele no Conselho de Ética?
Nós dependemos da decisão judicial. Eu não sei como vai ser o desenrolar e vamos ver a resposta da Justiça. Sem a manifestação dela não podemos fazer nada. Ele está suspenso por dois meses. No dia 17 de janeiro, iniciaram a perícia nos equipamentos que levaram da Câmara, quando a operação contra Wellington foi deflagrada. O Ministério Público pediu o acompanhamento de um ministério de carreira da Câmara na catalogação do material apreendido.
Kalil deixou claro: ‘Henrique, você não precisa avisar. A casa é sua. Sempre que precisar, pode chegar’. Por essa abertura, vejo que ele não terá dificuldade
Para financiar a reforma do prédio da Câmara, a resposta oficial é que os recursos são da Caixa, que tem parceria pelo uso de espaço do edifício com terminais eletrônicos e na administração da folha. Mas nesse momento de crise econômica, a iniciativa não passa uma imagem ruim para a população?
Vou te dar uma resposta do jeito que eu penso. Nessa época de crise você vê a Caixa gastando milhões com Atlético, Cruzeiro e América. É muito indecente falar isso. Foi feito um convênio e eles se dispuseram a patrocinar a reforma. É mais do que justo, já que eles usam o prédio e movimentam o orçamento do funcionalismo da Casa, o que não é pouca coisa. Teve gente novata que chegou aqui e ligou para imprensa, dizendo que era um absurdo e tirou foto lá no meio do plenário com braços abertos, como se fosse uma asa delta, dizendo que era dinheiro do povo. É dinheiro da Caixa.
Caso o Kalil vete o projeto que obriga ensino religioso nas escolas o senhor tem a pretensão de derrubá-lo?
Eu votei contra. Hoje, não vejo necessidade de ter aula religiosa em escola. O mundo religioso é muito diverso, com católico, espírita, testemunha de Jeová, evangélico, muçulmano. Você vai dar aula de quê? De bíblia? Dar aula bíblica em escola? Toda igreja já tem aula para criança, adolescente. Não vejo sentido no projeto, com todo respeito a quem o apresentou.
Além do Plano Diretor, outro projeto apresentada pelo Executivo na gestão passada e que não avançou é a reforma da previdência dos servidores. É prioridade?
Esse é um dos projetos sobre os quais o prefeito terá que opinar. O projeto original do Executivo atenderia o funcionalismo, mas as emendas o estragaram. Até se chegou a suspender a tramitação. O problema da previdência é que há sindicatos de servidores que ficam puxando a corda para lados opostos, como se fosse a corda do sírio de Nazaré. Em Belém, ficam a semana inteira puxando de um lado para o outro e não conseguem sair do lugar. Ficou assim, no caso da previdência municipal. Eles querem equiparação salarial e isso prejudica as contas do município. Quem, por exemplo, é professor de UMEI não pode ser remunerado como o professor do Ensino Fundamental. Se igualar, a prefeitura não têm caixa para manter.