Base enxuta coloca em xeque eventual governo de Marina

Aline Louise/Hoje em Dia
07/09/2014 às 08:12.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:06

(Valter Campanato/Agência Brasil )

Governabilidade. Essa é a grande questão que tem sido posta para um futuro mandato presidencial desde que Marina Silva se tornou a candidata do PSB e tem crescido nas pesquisas. Ela chegou a empatar com a presidente e candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT), deixando o candidato tucano Aécio Neves em terceiro lugar na disputa.    As dúvidas são: caso seja eleita, terá apoio suficiente no Congresso para implementar os projetos previstos no seu programa de governo? Conseguirá manter seu mandato? A coligação “Unidos pelo Brasil”, de Marina Silva, tem a menor representatividade no Congresso, com 33 deputados na Câmara, o que representa apenas 6% dos parlamentares da Casa. E o prognóstico é que essa bancada fique ainda menor na próxima legislatura. No Senado, o quadro não é diferente. Atualmente, ela contaria com apoio de apenas quatro dos 81 senadores. Cenário que, na melhor das previsões, pode chegar a sete.    O analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) Antônio Augusto de Queiroz lembra que, na verdade, nenhum presidente eleito no Brasil desde a Constituição de 1988 teve maioria suficiente para viabilizar seu governo sem agregar parlamentares extra-coligação.   Ele explica que o governo, para manter sua base, utiliza de três recursos de poder: compartilhar a gestão, oferecendo cargos na administração pública; liberar recursos do orçamento; e negociar o conteúdo da política pública. “Todos os presidentes utilizaram esses recursos. Se não tiver apoio no Congresso, não governa”.    Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, o cientista político Paulo Roberto Figueira explica que temos hoje, no Brasil, o chamado presidencialismo de coalizão, que tem sua natureza no sistema pluripartidário. Para ele, os 32 partidos existentes configuram um Congresso fragmentado. “Nunca um presidente conseguiu uma base suficientemente forte que não precisasse convidar novos parceiros para aprovar suas propostas. Presidentes que se elegeram com base baixa e não conseguiram negociar enfrentaram dificuldade de governar, como o Collor”, reforça.    O cientista político e professor do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas Robson Sávio Reis lembra que, para viabilizar seu governo, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) se coligou com o PFL. “Esta aliança deu um viés mais de direita para um partido que se elegeu com um programa social democrata”, diz. Já Lula e Dilma (PT) fizeram aliança com o PMDB. “Um partido muito fragmentado, de lideranças de caciques regionais, mas que no Congresso sempre teve grande bancada”, classifica.   Discurso contra ‘velha política’ é duvidoso   Além de ter uma bancada reduzida, outra dúvida que paira sobre a governabilidade de um eventual mandato de Marina Silva nasce do seu discurso, que rechaça a “velha política”, apregoa trabalhar com os “melhores”, de certa forma, negando a estrutura partidária brasileira, na avaliação dos especialistas. “O discurso dela, de que não aceita a velha política, é eleitoral. Setores da velha política já a apoiam sem nenhum constrangimento”, diz o cientista político Paulo Roberto Figueira.    Robson Sávio Reis diz que restam para Marina duas opções. “Ou ela sai desse discurso meio dúbio e duvidoso de que ela estaria acima da política tradicional e dos partidos, para ter condições de fazer articulação direta com o povo, porque isso é populismo; ou mantém o discurso e corre o risco de não completar o governo”.    Segundo Robson Sávio, não é possível fazer “futurologia”, mas dá para afirmar que, se Marina não fizer coalização, no modelo atual, não terá condições de governabilidade. “O discurso dela de desdenhar das intuições é atrasado e perigo. Perigoso porque dentro do nosso sistema, os partidos são formas de mediação entre Estado e sociedade. Atrasado porque tenta superar uma forma de realização da democracia contemporânea que se dá por representação, que se concretiza nos partidos. Eles são importantes, apesar de ainda estarem em maturação no Brasil”.   Paulo Roberto também afirma que só o apoio popular não sustenta um governo. “O capital eleitoral de quem ganhou cria, num primeiro momento, uma espécie de pressão pública sobre o Congresso, mas isso não se sustenta durante todo mandato”.    Crise   “Em tese, é mais provável que a gente enfrente uma crise de governabilidade com Marina do que com Dilma ou Aécio. Os dois teriam mais facilidade de compor um arranjo parlamentar do que Marina, se mantiver a postura que sinaliza em seus discursos. Ou ela descumpre o discurso e amplia as negociações ou mantém e enfrenta uma crise de governabilidade”, analisa Paulo Roberto Figueira.

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