Mobilização popular não sustenta ação contra Dilma

Giulia Mendes - Hoje em Dia
15/03/2015 às 07:13.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:21

(Samuel Costa – 09/03/2015)

Pouco mais de dois meses após o início do segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff (PT) enfrenta uma onda pró-impeachment que começou na web, mas já ganhou as ruas. Na semana passada, um “panelaço” mostrou a insatisfação de muitos brasileiros com a governante. Para este domingo (15), mais de 1 milhão de pessoas confirmaram presença em dezenas de manifestações pelo país pela interrupção do mandato da petista.    De acordo com o Movimento Brasil Livre, os eventos deverão ocorrer durante todo o dia em 32 cidades brasileiras e até em Sidney, na Austrália. Em Belo Horizonte, dois atos estão marcados para 10h e 15h, saindo da Praça da Liberdade, região Centro-Sul da capital. Os organizadores esperam cerca de 30 mil pessoas.   Pelas redes sociais, os manifestantes pedem contribuição em dinheiro para arcar com custos de megafones, aluguel de carros de som, faixas e cartazes com o slogan: “É hora de demandar o impeachment da presidente Dilma Rousseff”.   Contudo, apesar da movimentação popular, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto pondera que não há condições de abrir um processo de impeachment contra a presidente da República.    “Quanto ao impeachment, é preciso entender que o processo só cabe diante de um crime de responsabilidade nos termos da Constituição. O presidente da República não responde por atos estranhos à sua função. Se o alvo das manifestações significar uma reclamação por atos persistentes de corrupção a partir de esferas do poder, ou carência e mau desempenho dos serviços públicos, ou também uma insuficiência da presença nos elementares campos das atividades de segurança pública, de educação, de saúde, tudo é válido. Agora, se o foco for o impeachment da presidente, é preciso lembrar que, pelo menos a meu juízo, e acho que não estou sozinho, ainda não é possível deflagrar um processo contra a presidente Dilma Rousseff”, afirmou Ayres Britto.   O procurador do Estado e professor de Direito Constitucional do Centro Universitário UNA, Daniel Cateb, concorda. “Não há hipóteses jurídicas para enquadrar a presidente em um caso de impeachment”, afirma. Segundo ele, o artigo 85 da Constituição Federal de 1988 fala sobre crimes de responsabilidade que atentem contra a Constituição Brasileira.   “Nós podemos procurar que não vamos encontrar nenhum elemento para iniciar um processo como este. Os manifestantes alegam que a presidente possa estar envolvida nos desvios da Petrobras, o que significaria um ato contra a probidade na administração, mas ainda não há indícios de que possa existir uma responsabilidade direta de Dilma, mesmo quando era ministra e presidente do conselho da Petrobras”, diz Cateb.   Quando se compara o quadro de hoje ao de 1992, quando o então presidente Fernando Collor de Melo sofreu o impeachment, há diferenças consideráveis, na visão dos especialistas. No caso de Collor, ficou comprovado o uso de verba pública pelo chefe do Executivo.    No entanto, o jurista Ives Gandra vem sustentando a posição de que é possível, juridicamente, a abertura de processo de impeachment contra a presidente. Nesta semana, em entrevista a um programa de televisão, ele reiterou a colocação publicada no mês passado na Folha de S. Paulo, em que a culpa sustentaria o pedido de derrubada de Dilma. “A culpa dela (Dilma), mesmo que ela não tenha praticado aqueles atos, por omissão, por deixar que acontecessem, imprudência, imperícia, haveria argumento jurídico para o impeachment”, disse.   Apesar da discussão, a mobilização para o protesto deste domingo (15) ganhou força nos últimos dias e a população quer mostrar a insatisfação com o governo. Para o diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Fernando Jayme, a escolha da maioria que votou para presidente, em 2014, deve prevalecer. “O que estou percebendo nessas convocações é um sentimento de reverter uma derrota que aconteceu nas urnas, dentro das regras democráticas. Não tem cabimento nem ambiente para isso”, disse Fernando.   Para ser instaurado, o processo de impeachment precisa antes ser aprovado por 342 dos 513 parlamentares na Câmara dos Deputados. “Uma vez aceito pela Câmara, o processo segue para o Senado, que irá julgar os crimes. Para ser condenado, o presidente precisa ter dois terços dos senadores contra ele”, ressaltou Cateb.    Renúncia seria a saída na avaliação da oposição   O deputado federal e presidente do PSDB em Minas, Marcus Pestana, vem estimulando as manifestações por meio de sua conta no Twitter. Porém, afirma que os movimentos não são partidários. “Nós, do PSDB, vamos respeitar as manifestações legítimas, que serão de extrema importância para a nação brasileira. O impeachment não ocupa nossa agenda neste momento, mas cresce na população o desejo de que a presidente renuncie. A base de governo está estatelada no Congresso e ela (Dilma Rousseff) não demonstra capacidade de enfrentar uma crise desse porte”, disse Pestana.   Para o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG), a oposição não aceitou o resultado eleitoral democrático. “Lamentavelmente, desde quando terminaram as eleições, ao invés de elaborar propostas de gestão para o desenvolvimento do país, eles preferem gastar energia buscando forças na sociedade, organizando manifestações populares, uns abertamente e outros timidamente”, criticou.   O professor e procurador de Estado Daniel Cateb acredita que não haja interesse da oposição em um impeachment. “Não vejo interesse do PSDB em tirar a presidente Dilma, pois necessariamente quem vai assumir é o vice Michel Temer, com novo fôlego e apoio, o que dificultaria a vida da oposição. No caso do ex-presidente e senador Fernando Collor (PTB-AL), os partidos não deram sustentação. Ele não tinha o apoio nem de 20% de deputados e senadores, e então foi comprovada improbidade administrativa”.    GRIFE ANTIPETISTA   Empresários já estão lucrando com produtos “anti-PT” e “anti-Dilma”. É o caso do paulista Sérgio Luiz Kamalakian Savone, proprietário da grife Sérgio K, com lojas em Belo Horizonte, São Paulo e Brasília. Savone produz camisetas com o slogan “A culpa não é minha, eu votei no Aécio” e vende a R$ 99.   As peças já estão esgotadas na loja virtual da marca, mas ainda são vendidas nas lojas físicas, com estoque limitado, segundo o empresário. “O interesse em criar essa linha surgiu no início da campanha para eleições presidenciais, com intuito de apoiar o PSDB. Também somos responsáveis pela criação da camiseta com slogan ‘Uai, we can’”, destacou Sérgio.    Já o grupo “Revoltados Online, um dos que estão à frente da campanha pelo “Fora Dilma” nas redes sociais, criou uma loja na internet para comercializar camisetas, bonés e adesivos pedindo o “Impeachment já” da presidente, com o desenho do brasão da República. O combo com uma camiseta, um boné e cinco adesivos sai por R$ 175.   A advogada Júlia Molinare, de 32 anos, é responsável pela criação do evento na rede social que convoca os belo-horizontinos para a manifestação deste domingo (15). “Quando começaram a divulgar que haveria uma manifestação nacional, criei o evento para fazer a convocação local. O comparecimento será fundamental para que os nossos mandatários comprovem que a indignação é real”.   Campanha pela ‘volta da moral’ será apresentada por militares    Além da mobilização popular nas redes sociais para o impeachment da presidente Dilma Rousseff, o Clube Militar, instituição formada por militares da Marinha, do Exército e da Força Aérea, anunciou a criação de uma campanha pela volta da “moral à sociedade brasileira”.   O ato de lançamento, marcado para esta quinta-feira, na sede do Clube Militar, no Rio de Janeiro, já recebeu o apoio de instituições, como a Associação Brasileira de Imprensa, e de formadores de opinião, como o jurista Ives Gandra.    Apesar da proximidade das datas, o coronel Ivan Cosme, diretor de Comunicação Social do Clube Militar, garante que a campanha não tem ligação com os grupos que pedem o impeachment. “Não temos vínculo com outros movimentos. Nossas instituições estão corrompidas, assim como nossa moral e nossos costumes, não só na política. A campanha está surgindo para ver se o Brasil acorda. A motivação surgiu da constatação de que os valores da sociedade apresentam distorções, como a corrupção em todos os níveis nacionais”, afirmou Cosme.    Para o coronel, uma possível intervenção militar por parte das Forças Armadas Brasileiras está descartada. “Não tem sentido pedir a volta do regime militar. O Brasil tem que aprender a se resolver dentro da democracia e não com armas. Aqui dentro do Clube Militar não pensamos que esse seja o caminho certo”, disse Ivan. 

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