Em meio à crise econômica que afeta praticamente todos os municípios brasileiros, a Prefeitura de Belo Horizonte está de olho na bagatela de R$ 7,6 bilhões de devedores de impostos. Para receber esse dinheiro, ou pelo menos parte dele, o Executivo municipal tem adotado diversas estratégias, como cobranças por correspondência, execuções fiscais e acordos com mediação do Tribunal de Justiça. A principal intenção é evitar que as disputas sejam travadas no âmbito dos processos judiciais, o que pode se arrastar por mais de uma década.
Atualmente, são 300 mil devedores da prefeitura, responsáveis pelo passivo de R$ 7,6 bilhões. Desse montante, 80,2% está na conta de 126 mil empresas e profissionais autônomos inadimplentes com o pagamento do Imposto Sobre Serviço (ISS). Os maiores devedores identificados pela Secretaria Municipal de Finanças são grandes conglomerados como bancos e empresas de engenharia, publicidade e saúde. A prefeitura não divulga o nome dos devedores.
Na outra ponta dos débitos, as pessoas físicas correspondem a 20,8% do total devido ao poder municipal. São 173 mil pessoas inadimplentes com o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), causando um rombo de R$ 1,5 bilhão ao poder público municipal.
Orçamento
Para se ter ideia do impacto dos recursos no caixa municipal, a arrecadação apenas dos débitos de responsabilidade das empresas, de R$ 6,1 bilhões, é metade da receita do município para este ano, prevista em R$ 12,9 bilhões, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Apenas com o recebimento das dívidas das empresas, seria possível pagar a folha de pessoal inteira da prefeitura, em torno de R$ 5 bilhões por ano. Ou permitiria ao município arcar sozinho com a ampliação do metrô, orçada em R$ 4 bilhões e de responsabilidade do governo federal.
Segundo Yuri Barbosa Souto, diretor de Arrecadação, Cobrança e Dívida Ativa da Secretaria Municipal da Fazenda (SMFA), caso não ocorra o pagamento nos prazos fixados na legislação municipal, os valores devidos à prefeitura são encaminhados para a inscrição na dívida ativa municipal, acrescidos de juros e multas moratórias.
Negociações
Apesar disso, a prefeitura oferece uma série de opções para o pagamentos dos débitos, antes de recorrer à Justiça, em tentativas de receber as dívidas durante um processo burocrático que pode demorar até um ano. “Procuramos facilitar negociação dos débitos, que podem ocorrer em nossos canais de atendimento presencial, como BH Resolve, e telefônico ou pela internet. Em nossa rotina de gerenciamento de cobrança, procuramos alertar e estimular os contribuintes a pagar seus débitos por meio de notificações e avisos”, explica Yuri.
Entre as opções, o poder público oferece pagamento à vista com 15% de desconto, parcelamento em até 60 vezes, pagamento por meio de compensação com a utilização de precatórios judiciais e quitação por meio da doação de bens imóveis por parte do devedor. Além disso, existe a opção de uma audiência de conciliação com mediação do TJMG. “A desjudicialização da cobrança fiscal por meio da utilização de formas mais amigáveis de cobrança constitui uma mudança de paradigma que produz benefícios ao contribuinte”, completa.
Custos
As variedades de condições de quitação são uma forma de a prefeitura evitar processos judiciais, que podem demorar até 12 anos e têm custo até 40% maior do que outras formas de acordo, segundo o advogado Jair Moreira, especializado em direito tributário.
“Um processo judicial, embora contenha juros e correções, pode ser prejudicial ao credor pelo tempo que irá demorar a receber. Além disso, é preciso prever os gastos com o processo, que podem onerar em até 40% mais do que em processos conciliatórios”, avalia Moreira.
Inadimplência
Mesmo com programas desenvolvidos pela Prefeitura de Belo Horizonte ao longo dos últimos anos para facilitar a quitação das dívidas, a inadimplência aumentou quase 20% nos últimos sete anos, em relação ao não pagamento de IPTU e ISS por parte de pessoas físicas e jurídicas.
Em 2013, a soma que o poder público municipal tinha a receber desses dois impostos não pagos era de R$ 6,4 bilhões, um valor 18,7% maior do que o deste ano, que chegou a R$ 7,6 bilhões, segundo a Secretaria Municipal da Fazenda.
O advogado Márcio Trindade, especialista em direito tributário, lembra que entre 2013 e 2014 a prefeitura lançou programas atrativos para o pagamento de dívidas, mas não conseguiu adesão dos maiores devedores, ou seja, as grandes empresas.
“As pessoas físicas normalmente gostam e aderem a descontos e programas especiais para quitação de dívidas. Mas as empresas, que têm as maiores dívidas, não”, analisa o advogado.
Em 2013, foi lançado o programa Em Dia Com a Cidade, que ofereceu o perdão de até 90% sobre valores de multa e juros para todas as dívidas de IPTU e ISS para quem estivesse disposto a realizar a quitação integral em até 30 dias.
“A maioria das ações do poder público é para tentar receber os valores que tem direito em impostos da forma mais amigável possível. Mas, como não há sanção que sequer restrinja principalmente a atuação das empresas inadimplentes, o devedor sempre opta por postergar ao máximo o pagamento ou um acordo. É preciso rever essa prática”, analisa Trindade.