(Flávio Tavares)
O rápido avanço das tecnologias digitais da comunicação, que propiciam modelos de negócios mais atraentes para os consumidores, e a grave crise econômica que atingiu o país nos últimos três anos provocaram, em 2017, a maior queda no número de contratos ativos de TV por assinatura no país desde 2002.
Minas Gerais é o terceiro no ranking de estados que mais tiveram perdas, depois de São Paulo (menos 447,1 mil) e Rio de Janeiro (menos 97,8 mil). Foram 38,1 mil contratos a menos em 2017, recuo de 2,41% em relação a 2016 – ou 150 mil pessoas fora da base de clientes diretos e indiretos.
Segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em 2017, o número de assinantes brasileiros do serviço foi 938,7 mil menor do que em 2016 – o total passou de 18,9 milhões para 17,9 milhões. Levando-se em conta que cada contrato residencial é usufruido, em média, por quatro pessoas, estima-se que cerca de 3,7 milhões de telespectadores deixaram de consumir os canais pagos.
O número foi também o mais baixo do mercado de TVs por assinatura desde outubro de 2013 e representou uma queda de quase 2 milhões de assinantes desde o apogeu do mercado, em novembro de 2014, quando a base chegou a 19,6 milhões de contratos.
Para o vice-diretor de TV por assinatura e novas mídias da Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão (SET), Rodrigo Arnaut, a queda deve ser contínua, nos próximos anos. As operadoras de TV por assinatura, segundo ele, pagam, hoje, por um pecado estratégico cometido a partir do início do século, quando passaram a investir pesadamente em ampliação da estrutura de distribuição de seus sinais - cabeamento e antenas - sem dar o devido valor à qualidade e à variedade do conteúdo transmitido.
“Os grandes grupos investiram na expansão da rede, e não na produção de conteúdos próprios ou não, mas que realmente pudessem assegurar a sustentabilidade futura do negócio”, diz Arnaut.
“Repassaram o preço aos consumidores do mundo todo, fazendo pacotes cada vez mais caros e com canais que pouco têm a ver com a realidade cultural dos clientes, e abriram margem para o surgimento de serviços alternativos, como os das empresas de streaming, via Internet, que têm custo baixíssimo de infraestrutura mas investem alto em novos conteúdos”, acrescenta, citando a gigante Netflix.
Economia de Recorrência
O coordenador de programas MBA do Ibmec em Belo Horizonte, Eduardo Andrade, concorda com a avaliação. Segundo ele, o fenômeno da queda no número de assinaturas de TV pagas tradicionais e da ampliação do uso de serviços de streaming pelos consumidores também passa pela prevalência na sociedade atual da chamada “economia de recorrência”. O conceito trata da transformação das relações comerciais entre consumidores, empresas e segmentos, baseando o consumo em acesso, e não em propriedade.
“O mercado está cada vez mais contratando serviços em que empresas como a Netflix cobram pela locação do conteúdo que oferecem, com a vantagem de que pode ser consumido a qualquer tempo, e não pelo aluguel ou a propriedade de aparelhos que dão acesso aos serviços, caso das TVs por assinatura”, explica.
Diversificação
Boa parte dos consumidores que cancelaram serviços de TV por assinatura, privilegiando a TV aberta e os serviços de streaming - bem mais em conta no orçamento, como Netflix, HBO Go, Youtube e Amazon Prime -, fez isso não apenas por economia, mas também porque o conteúdo dos canais pagos não lhes atendia. É o caso da publicitária e professora Ana Paula Coelho, de 34 anos, de Contagem.
“Cheguei à conclusão de que não valeria a pena pagar R$ 200 por mês por um pacote de canais que eu simplesmente não assistiria, sendo que na Internet eu pagaria bem menos e teria uma programação de qualidade, podendo, inclusive, escolher o que e quando ver”, diz. Ana Paula conta que contratou Internet com boa taxa de banda larga e que, graças a esse serviço, não sente falta da TV, paga ou a aberta.
“Além de filmes, documentários e até reality shows, a Internet me propicia todo tipo de informação, com a vantagem de me dar opções múltiplas de fontes dessas informações”, completa a professora.
A engenheira ambiental Dayane Albano, de 27 anos, também eliminou a TV por assinatura, há três anos. Ela percebeu que pagava por serviços que simplesmente não usava, por ficar a maior parte do tempo fora de casa, o que incluía o telefone fixo.
Cancelou o pacote “combo” da operadora e resumiu tudo à Internet, além da conta de telefonia móvel.
“Tenho hoje em casa a TV aberta com a tecnologia digital, que melhorou muito o sinal e favoreceu quem quer desligar a TV por assinatura, e os serviços de streaming, como a Netflix. Conto com uma programação que me agrada até mais que a da TV por assinatura, que repete muito os filmes e outros programas, e vejo quando quero”, ressalta.
A vantagem no bolso também é enorme: Dayane diz que, com a mudança, deixou de gastar R$ 140 por mês, ou R$ 1.680 por ano. “Com esse dinheiro, dá até para fazer uma boa viagem de férias”, comemora.
Operadoras
Entre os quatro gigantes de TV por assinatura no Brasil, conforme a Anatel, a Claro, dona da Net, e a Vivo apresentaram as maiores quedas de assinantes em 2017. A Claro teve redução de 724,2 mil contratos, com recuo de 7,39% em sua carteira. A Vivo perdeu 131,4 mil contratos, ou 7,67% de sua base.
Já a Oi, que passa por recuperação judicial, adicionou 205,2 mil assinantes, e a Sky, 109,6 mil. Apesar dos números negativos, a Claro continua líder do setor no país, com 9 milhões de assinantes. É seguida pela Sky, com 5,6 milhões, a Vivo, com 1,58 milhões, e a Oi, com 1,5 milhão.
O Hoje em Dia apurou que os pacotes de TV por assinatura variam hoje, na capital, de R$ 14,90(pré-pago 30 dias) a R$ 359,90. Já uma assinatura da Netflix custa de R$ 19,90 a R$ 37,90.
As quatro operadoras foram procuradas para comentar a fuga de clientes. A Oi TV ressaltou, em nota, ter sido a que mais cresceu em Minas durante 2017, aumento a carteira em 16,4% no período, com um market share de 23,2%, e que isso se deve “às ofertas diferenciadas lançadas durante o ano”.
Também por nota, a Vivo informou que lidera “um processo de transformação digital” no país, com oferta completa de serviços fixos e móveis, e que acompanha “as tendências do mercado e as necessidades dos clientes”. Claro e Sky não responderam.