Venezuela vive momento de incerteza um mês após morte de Chávez

AFP
04/04/2013 às 14:44.
Atualizado em 21/11/2021 às 02:32

(Geraldo Caso)

CARACAS - Trinta dias após a morte de Hugo Chávez, a Venezuela está envolvida em uma intensa campanha eleitoral, marcada pela incerteza política e econômica e pelo vazio deixado pelo presidente, onipresente na vida política há 14 anos.

Apesar de ser prevista, a morte de Chávez no dia 5 de março comoveu o país inteiro. Nem mesmo seus opositores mais ferrenhos foram insensíveis ao drama que deixou metade do país de luto e toda a Venezuela em uma situação inédita.

"Neste momento, a palavra é incerteza, porque há um vazio muito grande. Chávez concentrou tudo e deixou este buraco enorme. Para os seus, substitui-lo é impossível. O máximo que podem tentar é imitá-lo, mas como vão governar este país se vencerem?", declarou à AFP a historiadora Margarita López Laya, coordenadora do livro "Ideias para debater o socialismo do século XXI".

Um mês depois de dois milhões de pessoas terem saído às ruas para se despedir de seu líder, para o candidato presidencial Nicolás Maduro, para o governo e para a metade dos cidadãos do país Chávez continua vivo e está no centro da campanha eleitoral.

A imagem do falecido chefe de Estado está nas paredes de Caracas e nos cartazes exibidos nos comícios eleitorais, seus discursos foram novamente divulgados pelos meios de comunicação oficiais, as referências a sua pessoa são contabilizadas em dezenas em cada dia e o programa eleitoral de Maduro é exatamente o mesmo programa de Chávez.

"Às vezes, parece que estou imaginando tudo isso, que a ausência do comandante é um pesadelo e que vou despertar", resumiu Maduro, favorito nas pesquisas, em uma entrevista à AFP.

A negação de sua morte se transformou em um instrumento de campanha. De certa forma, Chávez parece ser novamente candidato nas eleições presidenciais de 14 de abril, contra o opositor Henrique Capriles.

Mas a emoção destes 30 dias trepidantes vividos pela Venezuela ofusca os programas de governo dos dois candidatos e os problemas urgentes do país, a começar pela violência, pela inflação, pela escassez de produtos ou pela falta de divisas. "O que Capriles e Maduro farão para solucioná-los? Poucos venezuelanos sabem responder a esta pergunta".

"Maduro não enfrenta uma campanha eleitoral, parece estar em uma sessão de espiritismo e ser um médium de Chávez para ganhar votos e unir o chavismo. Manter viva a emoção chavista é uma tática eleitoral", declarou à AFP Manuel Felipe Sierra, veterano jornalista e autor de vários livros sobre a realidade política venezuelana como "Os Fios do Poder" ou "Quinze anos de evolução política".

A oposição evita falar do falecido presidente e criticá-lo, e Capriles tenta se concentrar no trabalho de Maduro e do governo desde a morte de Chávez.

"O presidente não está entre nós, infelizmente uma doença o levou, mas vimos tudo o que aconteceu depois e dizemos aos que são seguidores da causa: não permitam que, com base em um sentimento e em uma liderança na qual vocês acreditavam, sejam manipulados para que tomem uma decisão que não convém ao país", pediu Capriles em um comício.

"Maduro não é Chávez, não unifica o chavismo nem o motiva", corroborou o deputado opositor Ismael García.

Talvez por essa razão, Chávez siga presidindo o dia a dia do governo e esteja a caminho de se transformar em um "santo do povo".

Seu túmulo se converteu em um local de peregrinação, uma capela consagrada a "Santo Hugo Chávez" foi criada no bairro caraquenho de 23 de janeiro, onde o líder está sepultado, vídeos de televisões oficiais o mostram chegando ao paraíso e sendo recebido por Simón Bolívar, e o governo o classifica de "profeta", "comandante supremo da revolução" ou "redentor dos pobres".

Em um ataque de misticismo, Maduro chegou a assegurar esta semana que sentiu a presença de Chávez em um passarinho que entrou pela janela enquanto ele rezava.

Neste contexto, para López Maya, no dia 14 de abril milhões de venezuelanos emitirão "um voto de agradecimento a Chávez" ao depositar sua cédula a favor de Maduro, um político construído à sombra do falecido presidente e que deverá existir por si mesmo.

Mas a "liderança carismática não se transmite" e o efeito do uso sagrado de Chávez por Maduro está com os dias contados, insiste o representante de uma organização internacional em Caracas.

"A magia acabou e começa a política normal. Algo que com Chávez não podia ocorrer. Maduro vai ter que se responsabilizar pelos erros que cometer. Estamos vivendo os últimos suspiros do chavismo e o verdadeiro chavismo sem Chávez aparecerá no dia 15 de abril", afirmou ele, que não quis ter sua identidade revelada.

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