Retaliação

Estado admite risco de queima de ônibus ao banir cigarro em prisões de Minas

Documento da Polícia Penal lista "ameaças" da medida que pode afetar 60 mil presos até fim de agosto

Renato Fonseca e Ana Paula Lima
portal@hojeemdia.com.br
19/07/2024 às 20:30.
Atualizado em 19/07/2024 às 20:50
População carcerária em Minas chega a 60 mil pessoas; proibição do fumo vale para Ceresps e demais unidades, de pequeno, médio e grande portes (Marcelo Albert/TJMG)

População carcerária em Minas chega a 60 mil pessoas; proibição do fumo vale para Ceresps e demais unidades, de pequeno, médio e grande portes (Marcelo Albert/TJMG)

O risco de ônibus serem incendiados em retaliação à proibição de cigarros nas unidades prisionais de Minas preocupa as forças de segurança do Estado. A possibilidade é tratada como “ameaça”, conforme consta em relatório elaborado pela Polícia Penal. A norma atinge 60 mil presos e está prevista para entrar em vigor dentro de 12 dias em cadeias menores e nos Centros de Remanejamento (Ceresp) e até o fim de agosto nas unidades de médio e grande portes.

Além do perigo que ronda motoristas e passageiros do transporte coletivo, o chamando plano de ação cita como “ameaças” o aumento do preço do cigarro nos presídios, movimentações de familiares de presos, interferências do Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e Ordem dos Advogados (OAB) e o fato de 2024 ser ano eleitoral.

Outra preocupação é a existência de organizações criminosas dentro das cadeias, o que pode favorecer ocorrências internas. O documento ainda lista “fraquezas” previstas, como a implantação da medida a curto prazo e a existência de servidores que fazem uso do cigarro.

Apesar dos riscos, o documento aponta que a medida é viável. “A proposta apresentada mostra-se bastante eficaz”, informa o relatório da Polícia Penal. 

O órgão demonstrou os benefícios da medida, capaz de ser implantada sem custos ao Estado. Dentre as principais, a redução de doenças provocadas pelo tabagismo. A eliminação de isqueiros nas unidades é outro ponto forte – já que evita o risco de incêndios –, além de barrar o cigarro como moeda de troca para outras drogas, como a temida K.

Entenda a proibição dos cigarros nas unidades prisionais 

A entrada de cigarros será terminantemente proibida nas unidades prisionais menores e nos Ceresp. A norma vai vigorar também nas instituições de médio e grande porte. A justificativa do Estado é preservar “a saúde e a segurança”. Conforme o governo, a proibição garantirá “um ambiente livre das toxinas contidas nos cigarros” para os detentos e servidores. 

A proibição foi comunicada por memorando aos diretores de polícia penal no último dia 4. Em entrevista ao HOJE EM DIA, a pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp) da UFMG, Isabela Araújo explicou que o cigarro tem um valor importante no sistema prisional, sendo usado como moeda de troca. “É uma alternativa criada pela própria população prisional para ter acesso a itens básicos, como sabonete”, diz.

Para a especialista, embora exista a justificativa da saúde, é preciso analisar se a proibição será feita em cima de uma base realista, que considere, por exemplo, a necessidade de suporte para esse público fumante – que pode nem ter sido quantificado.

O cigarro pode ser moeda de troca, mas também um vício, uma maneira de aliviar o estresse. Fumar ali é uma prática do cotidiano, então a proibição de supetão pode causar reações. Unidades prisionais já são locais de tensão. É colocar mais pressão numa panela já efervescente”, avalia a especialista.

Por nota, o Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG) reafirmou o compromisso de proibir a entrada de cigarros em unidades prisionais de todo o Estado. A pasta relembrou que a medida já era vigente em 46% dos presídios e penitenciárias de Minas – além de outros estados do país. Além disso, reforçou que até o momento não há registro de "nenhuma intercorrência de segurança". Veja na íntegra:

O Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG) reafirma seu compromisso com a decisão de proibir a entrada de cigarros em unidades prisionais de todo o Estado. Vale lembrar que a medida já era vigente em 46% dos presídios e penitenciárias de Minas – além de outros estados do país – e que a decisão para implantação da nova regra leva em consideração fatores ligados à saúde dos custodiados, assim como a segurança das unidades prisionais.

A Polícia Penal, como Força de Segurança, precisa se adiantar a qualquer possível cenário decorrente da decisão e, por isso, planeja a resolução de intercorrências de forma detalhada, independente da maior ou menor sinalização de chance de acontecimento de problemas. O documento em questão é de circulação interna e restrita.

Até o momento não há registro de nenhuma intercorrência de segurança nas unidades que já se anteciparam às datas previstas para proibição dos cigarros. No momento, a proibição já alcança 57% das unidades. O Depen-MG segue vigilante e atento.

Como complemento aos esclarecimentos de segurança, reforçamos que a medida de proibição dos cigarros será aplicada paulatinamente. Até 31 de julho o impedimento alcançará as unidades de pequeno porte e os Centros de Remanejamento – os Ceresp e, até 31 de agosto, as unidades de médio e grande porte.  

A Diretoria de Saúde do Depen-MG acompanhará de perto o andamento da medida para garantir àqueles que venham a sofrer abstinência o acompanhamento junto ao Programa Nacional de Controle do Tabagismo, bem como a assistência dos profissionais de saúde e psicossocial que atuam nas unidades prisionais do estado.

Com essa medida o Estado busca combater quatro frentes: o uso do cigarro em si - inclusive os que são fruto de contrabando, o comércio ilegal (moeda de troca dentro das unidades), o acesso a itens que produzem fogo (isqueiros e fósforos) e o uso de drogas em geral (incluindo drogas K).

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